Um dos melhores filmes deste ano é La Chimera, da diretora Alice Rohrwacher. O filme se passa nos anos 80, quando a profanação de túmulos etruscos se tornara uma coqueluche na Itália.
Tombaroli era como chamavam aos bandos de violadores de tumbas, ladrões de sepulturas que pilhavam obras de arte e utensílios variados de cemitérios etruscos, com o objetivo de revendê-los no mercado negro da arte e do colecionismo arqueológico.
Bem no meio do filme apresentam-se dois músicos rapsodiando em ottava rima, decassílabos em estrofe de oito versos, a história desses infelizes brancaleones que tentam encontrar a felicidade contrabandeando a riqueza de uma civilização extinta.
É um momento sublime usando a poesia e a música de poetas populares, muito parecidos aos rapsodos iuguslavos e aedos gregos, sobre quem já escrevi, ou aos repentistas brasileiros.
Dois músicos calabreses, Valentino Santagati e Piero Crucitti, cantam a metáfora central de La Chimera, sumarizando em três canções ao longo do filme toda a melancolia dos tombaroli.
( Na cena acima, há duas canções. A terceira aparecerá mais perto do fim, aqui).
Como os arqueólogos marginais da sua história, Alice Rohrwacher faz em La Chimera uma arqueologia do cinema, exumando Fellini, Chaplin, De Sica, Rossellini, Indiana Jones... Rohrwacher recita trechos de filmes como se os cantasse, à maneira dos grandes poetas que recriam e atualizam a tradição a cada verso.
La Chimera é o melhor de Rohrwacher até agora - um belo filme, uma grande obra.